Quando o céu é o limite, regulamentar é preciso
Um jovem acessa o site de sua marca de tênis preferida, escolhe o modelo que mais lhe agrada e finaliza a compra. Em seguida, vai para o pátio de casa e coloca no local informado o sinalizador onde deverá pousar um drone com o produto. A cena não é de nenhum filme de ficção científica. Já começa a fazer parte da realidade de muitos norte-americanos acostumados a conviver com os “entregadores vindos do céu”. A Amazon tem testado um sistema de entrega de mercadorias por meio de Aeronaves Remotamente Pilotadas (RPAs). O Google, por sua vez, vem recrutando pilotos para a operação desses equipamentos.
Em diversos países, os drones já são utilizados para entregar pizzas, monitorar o trânsito ou filmar eventos, ampliando, cada vez mais, sua presença no cotidiano. Não há dúvidas, portanto, do enorme potencial econômico e operacional dessas aeronaves. De acordo com a Consumer Electronics Association (CEA), em 2014 as vendas de drones alcançaram em torno de US$ 84 milhões e 250 mil unidades. Para 2018, a CEA prevê que as vendas destes equipamentos nos EUA alcançarão a marca de US$ 300 milhões e cerca de um milhão de unidades. Matéria recente do Washington Post revela estimativas da Federal Aviation Administration (FAA), em uma visão conservadora, de que dentro de uma década os drones privados constituirão uma indústria de US$ 90 bilhões.
No Brasil, não há estatísticas oficiais, mas se calcula que existam entre 50 mil e 100 mil drones em operação. E a tendência, assim como no mercado norte-americano, é de expansão. De um lado, números e operações que avançam; de outro, um vácuo regulatório que precisa ser debatido. Nos Estados Unidos, a discussão envolvendo a regulamentação de aeronaves não-tripuladas tem se intensificado bastante nos últimos anos, devido ao crescimento do setor. Fontes dentro da própria indústria de drones admitem os grandes riscos de acidentes com essas aeronaves. Uma pesquisa do Centro de Estudos do Drone do Bard College visualizou 519 drones entre 21 de agosto do ano passado e 31 de janeiro. Desse total, 36% foram considerados eventos de quase-colisão, que é quando a aeronave não-tripulada passa a 150 metros de um avião.
O Brasil já começou a editar normas e pensar em regulamentação para o setor, principalmente no âmbito da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Mas ainda há muito que avançar em termos de legislação e fiscalização. No final de 2015, o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA), órgão central do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro, aprovou a edição da ICA 100-40 [sigla de Instrução do Comando da Aeronáutica, nesse caso, relativa aos sistemas de aeronaves remotamente pilotadas] que prevê que todos os voos de drones deverão ter autorização do DECEA – exatamente como no caso das aeronaves tripuladas.
Assim, se adota a premissa de que um drone é uma aeronave e, portanto, deve obedecer à regulamentação existente na aviação brasileira. Mesmo os voos no interior de prédios e construções fechadas, ainda que parcialmente, incluindo ginásios, estádios e arenas a céu aberto, são de total responsabilidade do proprietário da estrutura ou do locatário do imóvel e deverão estar autorizados. Os operadores de drones também deverão avalizar a sua operação mediante a contratação de seguro e podem responder criminalmente por colocar a vida a perigo, impedir ou dificultar a navegação aérea, por exemplo.
A urgência de se pensar na regulação de uma atividade que avança a passos rápidos no país foi um dos motivadores para a realização do 1º Simpósio Nacional de Direito Aeronáutico, que acontece na próxima sexta-feira (15), em Porto Alegre (RS), por iniciativa do escritório Freitas Macedo Advogados. Além dos drones, outros temas atuais da aviação serão debatidos, como acidentes aéreos, tributação de aeronaves, importação de peças, aviação comercial, aviação agrícola, táxi aéreo e legislação relativa a aeroportos.
A indústria aeronáutica é um excelente exemplo de quão rápida tem sido a evolução e a transformação dos paradigmas da sociedade em que vivemos. Por isso, a importância de promover um espaço qualificado que contribua para o debate e a divulgação das questões emergentes no campo do direito aplicado a essas atividades.
*Advogado, especialista em Direito Aeronáutico e sócio do escritório Freitas Macedo Advogados.
Veja mais notícias sobre Justiça.
Comentários: