Comparar imposto digital com CPMF é maldade, argumenta Guedes

Ministro da Economia destacou que tributação não acompanhou inovação tecnológica
Guedes adiantou que o governo pretende rever o Imposto sobre Produtos Industrializados, o IPI

O ministro da Economia, Paulo Guedes, declarou nesta quarta-feira (5) que comparar a criação do imposto sobre transações digitais com a antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) é maldade e ignorância. Guedes participa de audiência pública virtual da Comissão Mista Temporária da Reforma Tributária do Congresso Nacional. "As pessoas, inadequadamente, por maldade, por ignorância, falam que isso é nova CPMF, mas não há problema, o tempo é senhor da razão", afirmou. Ele justificou a futura proposta de criação do imposto com o argumento de que a tributação não acompanhou a inovação tecnológica. "O imposto digital é uma coisa para conversarmos à frente. Mas é claro que a economia é cada vez mais digital. Netflix, Google, todo mundo vem aqui, o brasileiro usa o serviço. São muito bem recebidos, são belíssimas inovações tecnológicas, mas ainda não conseguimos tributar corretamente", defendeu.

O imposto sobre pagamentos eletrônicos estudado pelo governo poderá ter alíquota de 0,2%. Guedes destacou que essa alíquota não prejudica os mais pobres. "Parece que há muita gente que não quer deixar as digitais em suas transações, escondidos atrás do pobre. Se você pegar o pobre que ganha R$ 200 de Bolsa Família e falar que há imposto de 0,2%, são R$ 0,40. Qualquer aumento que você der no Bolsa Família de R$10, R$20, R$30 já tirou [o pagamento do imposto]", exemplificou. Guedes acrescentou que é o rico que faz transações digitais. "O rico é quem mais faz transação, é quem mais consome serviço digital, serviço de saúde, serviço de educação, lancha, barco, caviar, e está isento, se escondendo atrás do pobre", ressaltou.

Guedes adiantou que o governo pretende rever o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). "Vamos ter de falar de IPI de linha branca, vamos ter de falar em desoneração, eliminação de vários IPIs que incidem justamente sobre os pobres", reiterou. O ministro da Economia classificou o sistema tributário brasileiro atual como um "manicômio tributário" e reforçou que a reforma não vai gerar aumento de impostos. "Temos um regime hoje muito ruim: há R$ 300 bilhões de desoneração, ou seja, quem tem poder político consegue a desoneração aqui em Brasília, e outros R$ 3,5 trilhões de contencioso. Quem tem poder econômico simplesmente não paga e entra na Justiça. Essa é a demonstração de um sistema tributário perverso, regressivo, ineficiente, literalmente um manicômio tributário", afirmou.

"O rico é quem mais faz transação, é quem mais consome serviço digital, serviço de saúde, serviço de educação, lancha, barco, caviar, e está isento, se escondendo atrás do pobre"

Guedes afirmou que o "primeiro movimento" do governo na reforma tributária é a proposta de criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%. Essa contribuição substituirá o Programa de Integração Social e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (PIS/Cofins). O ministro entregou ao Congresso a proposta no dia 21 de julho, como a primeira parte da contribuição do governo federal para a reforma tributária. "Nosso primeiro passo nessa direção é exatamente o primeiro grande imposto sobre consumo, que é um tormento, é parte do manicômio tributário brasileiro. Para os senhores terem uma ideia, só a extinção do PIS/Cofins extingue 100 regimes especiais que tornam absolutamente inóspito o ambiente empresarial brasileiro", lembrou Guedes.

A proposta do governo trata apenas de tributos federais, com a criação da CBS. Para Guedes, cabe aos governos estaduais e municipais decidirem sobre os seus tributos, mas no futuro a ideia é permitir o acoplamento do imposto federal (CBS) a um "IVA [imposto sobre valor agregado] nacional". "Não cabe ao ministro da Fazenda invadir uma ação, um espaço constitucional que não é dele. Não sou eu que tenho de dizer quanto é que os Estados têm de cobrar, pois isso é uma atribuição reservada aos Estados. Não sou eu que tenho que dizer quanto a cidade de São Paulo, de Recife, de Fortaleza, de Salvador tem que cobrar de ISS. Essa é uma atribuição também reservada constitucionalmente aos municípios", defendeu. Ele acrescentou que cabe ao Congresso uniformizar a legislação tributária. "Agora, quem pode trabalhar e uniformizar isso, caso tenha sucesso? E é por isso que a reforma tributária está parada há 20 ou 30 anos. É o Congresso, é o Legislativo. Quem tem capacidade de fazer isso é o Legislativo. Cabe a nós colaborarmos, e o nosso passo inicial é exatamente nessa direção", afirmou.

De acordo com Guedes, o segundo movimento do governo federal é avançar na proposta para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e os impostos seletivos (incidentes sobre produtos específicos, como bebidas alcoólicas e cigarro). E o terceiro movimento contemplará alterações no Imposto de Renda e na tributação sobre a folha de pagamentos. O ministro tem defendido a criação de imposto sobre transações digitais na reforma tributária para compensar a desoneração da folha de pagamentos.

Criticado por parlamentares pelo fatiamento da proposta do governo, Guedes disse que a reforma por partes facilita o entendimento. "É uma coisa de cada vez para facilitar o raciocínio e o entendimento de todo mundo. Então, aí vem essa observação da reforma faseada ou a reforma inteira. Tenho a impressão de que, se nós colocarmos tudo de uma vez, só dificulta o entendimento", reiterou. O ministro da Economia comparou o envio da proposta em partes ao Congresso com uma sinfonia. "Quando vem uma coisa de cada vez, é como se fossem capítulos de um livro ou como uma sinfonia. Eu também sou músico, eu também gosto de música e toco piano, deputado Aguinaldo [Ribeiro (PP – PB), que havia dito que é músico]. Então, se você tocar os seis movimentos ao mesmo tempo é um barulho. Se você fizer o primeiro movimento, o segundo movimento, o terceiro movimento, todo mundo entende a peça e vai ser agradável e vai ser rápido. Mas nós estamos prontos. Se quiserem podemos aumentar o barulho", sugeriu.

 "Quando vem uma coisa de cada vez, é como se fossem capítulos de um livro ou como uma sinfonia. Eu também sou músico, eu também gosto de música e toco piano. Então, se você tocar os seis movimentos ao mesmo tempo é um barulho. Se você fizer o primeiro movimento, o segundo movimento, o terceiro movimento, todo mundo entende a peça e vai ser agradável e vai ser rápido. Se quiserem podemos aumentar o barulho"

Simplificação
Guedes reforçou que a reforma tem o propósito de "reduzir, simplificar, melhorar a progressividade e tornar eficiente e moderno o sistema tributário" brasileiro. Ele acrescentou que é um compromisso de campanha do atual governo não aumentar a carga tributária. "Não vamos aumentar impostos. O povo já paga imposto demais. De 18% do PIB, saltamos para 36% em alguns anos. Ou seja, acima da media dos países em desenvolvimento e sem contrapartida para a população. Nosso programa é simplificação e redução. A carga pode ser a mesma, mas vamos substituir e reduzir a quantidade de impostos Vamos substituir 10, 15, 20 impostos por um. Por exemplo, inauguramos substituindo agora dois – PIS/Cofins – por um, e assim seguiremos fazendo", detalhou.

Alternativas
O Congresso Nacional tem três propostas de reforma tributária em análise. Duas já em tramitação no Legislativo (as propostas de emenda à Constituição 110/2019, no Senado, e PEC 45/2019, na Câmara) e uma enviada pelo governo recentemente, o projeto de lei (PL) 3.887/2020, baseada na unificação do PIS com a Cofins para criação da Contribuição Social sobre Movimentação de Bens e Serviços (CBS). Segundo o ministro, a equipe econômica decidiu começar pelo PIS e pela Cofins por serem tributos complexos, onerosos e com reflexos muito negativos no ambiente de negócios. No Superior Tribunal de Justiça (STJ), PIS e Cofins representam 25% dos processos em que a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional atua. No Supremo Tribunal Federal (STF), 22 temas com repercussão geral travam mais de 10 mil processos nas instâncias inferiores. E na Receita, há 71 mil processos administrativos em andamento.

*Com Agências Brasil e Senado

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