Suinocultura: a mais nova aposta inusitada da Huawei

Técnicos da Embrapa Suínos e Aves, de Concórdia, avaliam os impactos que o uso da tecnologia pode trazer para a cadeia de proteína animal do Sul
A IoT poderá ser utilizada para a adição de tecnologias como balanças inteligentes, com as quais é possível coletar o peso do animal enquanto ele se alimenta

Enquanto continua sofrendo duras sanções dos Estados Unidos contra seus smartphones, que não permitiram que a empresa importasse componentes para modelos 5G, a gigante chinesa Huawei decidiu apostar em uma área bastante diferente: o desenvolvimento de tecnologias para a criação de porcos. A empresa afirmou que está lançando um projeto de inteligência artificial com o objetivo de modernizar as fazendas de suínos, com a TI sendo introduzida para detectar doenças e rastrear os animais. A tecnologia de reconhecimento facial permitirá que os agricultores identifiquem porcos individualmente, e outras tecnologias ajudarão a monitorar peso, dieta e exercícios dos animais. São funcionalidades de grande importância para o setor, que, desde o estouro da peste suína na China em agosto de 2018, viu uma redução de 25% na população de suínos do país.

A Huawei não é a primeira empresa a se aventurar nesse nicho. Outros gigantes, incluindo JD.com, NetEase e Alibaba, buscaram trazer novas tecnologias para a suinocultura na China, devido à sua importância como indústria. E os avanços que são feitos fora do país, naturalmente, acabam respingando no Brasil, que vê na suinocultura um grande alicerce. Apesar dos efeitos negativos da pandemia nas importações de insumos como soja e milho, que influenciou os processos de produção e resultou em alta no custo final do produto ao consumidor, projeções da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) indicam que haverá um aumento na produção nacional de carne suína impulsionada pela alta demanda estabelecida da China. A expectativa é que, em 2021, o Brasil siga como o terceiro maior produtor mundial e exportador de carne suína – um cenário que, sem dúvidas, terá grandes efeitos para o Sul que exerce protagonismo na atividade.

A pedido de AMANHÃ, técnicos da Embrapa Suínos e Aves, de Concórdia (SC), avaliaram os impactos que esse avanço na tecnologia pode trazer para a suinocultura. Segundo eles, a chamada Suinocultura 4.0 já vem sendo observada há 11 anos, quando o governo alemão apresentou o Plano de Ação Estratégica de Alta Tecnologia 2010/2020. O fenômeno vem criando, aos poucos, um mundo onde vão interagir sistemas inteligentes, máquinas que aprendem no dia a dia e técnicos especializados. Essas estruturas implantarão tecnologias, métodos, linguagens e estruturas para coletar o máximo possível de informações, integrá-las a bases de dados gigantescas, interpretar essas informações para elaborar respostas eficientes adaptadas a situações específicas e orientar máquinas, sistemas e operadores humanos a tomarem decisões com base no que foi coletado e analisado. Tudo em tempo real, numa via de mão dupla de comunicação ultrarrápida e confiável.

O processamento de imagens, por exemplo, é o adotado pela Huawei: pode identificar características nos animais como a busca por água e comida e comportamentos que fujam da normalidade, informações que serão usadas para o fornecimento dietas adequadas para cada suíno, para determinar quem deve ser vacinado e controlar o processo de reprodução. Uma vez que esses dados são coletados, a inteligência artificial pode criar modelos matemáticos que preveem impactos ambientais e facilitam a tomada de decisão no campo. A IoT também poderá ser utilizada para a adição de tecnologias como balanças inteligentes, com as quais é possível coletar o peso do animal enquanto ele se alimenta. Assim, pelos modelos de curvas de crescimento introduzidas nos processadores das máquinas, é possível identificar se a fórmula da dieta está dando resultado.

Mas de nada adianta coletar os dados brutos no campo se não se pode processá-los ou transmiti-los em tempo real. Aí entra a Internet 5G, que em pouco tempo será uma realidade e irá auxiliar a comunicação no campo, com a cobertura de redes e permitindo maior capacidade de transmissão de informações. No entanto, mesmo que haja atrasos na implementação dessa tecnologia, segundo os técnicos da Embrapa, a área de edge computing poderá fechar essa lacuna, desenvolvendo equipamentos e sistemas que ficam na própria granja e podem receber dados dos sensores locais, processando-os e fornecendo ao gestor as informações de que ele precisa.

Para a Embrapa, a primeira onda visível de mudanças da Suinocultura 4.0 já está acontecendo e pode ser dividida em dois segmentos de inovação. O primeiro diz respeito ao registro de informações: edificações de produção, sistemas de tratamento de dejetos, meios de transporte, plantas de abate e toda e qualquer instalação ligada à cadeia produtiva de suínos estão sendo inundados de sensores (para registrar a umidade, temperatura, concentração de amônia, CO2, poeira, consumo de água, peso dos animais...), câmeras (2D e 3D, focadas no monitoramento e atividade dos animais; ou para orientar máquinas que farão a desossa de carcaças na linha de abate) e microfones. Todos esses equipamentos, quando largamente disseminados, vão exercer as funções de "olhos, ouvidos e narizes" da Suinocultura 4.0. O segundo segmento é o desenvolvimento dos sistemas ciber-físicos, que analisam, comparam e interpretam os dados que vêm dos sensores, câmeras e microfones instalados no mundo real.

Esses sistemas já existem e já foram implementados em alguns pontos. Quando estiverem suficientemente disseminados, segundo os técnicos, que a suinocultura entrará em sua fase mais transformadora. "É neste momento, num futuro não muito distante, que veremos no Brasil robôs autônomos identificando o momento de higienizar as baias e edificações, executando um corte numa linha de abate ou identificando o nível de estresse dos animais e adotando medidas para melhorar o ambiente. Eles vão interagir com outras máquinas e aprender com humanos. Por exemplo, um robô autônomo gerenciará os sensores de uma instalação e atuará conectado com impressoras 3D para executar consertos de manutenção preventiva definidos previamente por um operador. Além disso, as mais variadas tarefas serão realizadas através de interfaces de toque e voz, que não só responderão à comandos, mas também poderão tomar decisões a partir de perguntas que forem feitas pelos usuários", antecipa a nota da Embrapa de Concórdia que é assinada pelos técnicos Jean Carlos Villas Boas Correia, Darci Dambroz, Paulo Armando Victória de Oliveira e Elsio Antonio Pereira de Figueiredo.

*Colaboração de Marcos Graciani

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