Prosa concreta

Morre Pedro Simch, um dos nomes da arquitetura comercial do Rio Grande do Sul
Nas últimas cinco ou seis décadas, poucos arquitetos moldaram tanto a paisagem corporativa do Rio Grande do Sul quanto Pedro Simch, falecido no último dia 24, aos 90 anos

Todo grande empreendimento, seja ele uma fábrica, loja ou sede administrativa, começa com um projeto – e não me refiro, aqui, à numeralha que avalia sua viabilidade financeira nem ao fraseado que vende "conceitos" e "propostas de valor" em PowerPoints. Falo de projetos arquitetônicos, mesmo, aqueles saídos de pranchetas e AutoCADs e que dispõem edificações, organizam espaços, estabelecem fluxos e acessos – as formas de interação humana e a eficiência econômica dos negócios, em suma.

Nas últimas cinco ou seis décadas, poucos arquitetos moldaram tanto a paisagem corporativa do Rio Grande do Sul quanto Pedro Simch, falecido no último dia 24, aos 90 anos. As instalações do Sistema Fiergs, no fim da Avenida Assis Brasil, em Porto Alegre, incluindo seu conhecido teatro; a sede do CIEE-RS, na Avenida Dom Pedro, e do Grupo Dimed/Panvel, em Eldorado do Sul; o showroom da Dell Anno, em Bento Gonçalves, além de várias plantas produtivas do Grupo Gerdau espalhadas pelo estado e fora dele, saíram das lapiseiras e dos computadores de seu escritório. A cronologia variada dessas obras, que começam na década de 1970 e chegam ao novo século, não deixa mentir: a longeva carreira foi devidamente reconhecida pelo meio empresarial gaúcho porque venceu o teste do tempo.

A parceria mais constante, com a Gerdau, sugere os motivos da preferência. Quando Simch reuniu suas realizações em um portfólio, anos atrás, coube ao CEO do grupo siderúrgico, Jorge Gerdau Johannpeter, escrever a apresentação. Nela, fez questão de frisar o compromisso do profissional com prazos e orçamentos, frequentemente descumpridos em trabalhos do gênero. Elogio modesto? Então dê uma procurada no que se diz sobre o starchitect Santiago Calatrava ao redor do mundo. O espanhol, responsável pelo Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, é um especialista em estourar custos e criar estruturas disfuncionais e de difícil manutenção, sempre em nome do impacto visual e da pretensa atratividade turística de suas criações.

A arquitetura não compreende apenas uma estética – é acima de tudo, uma ética: do aproveitamento do espaço, do não-desperdício, de respeito ao entorno e a quem usa e financia uma construção. Antes da poesia da forma, há a prosa da função, e a primeira de nada vale sem a segunda.

Arquitetos e engenheiros têm uma vantagem em relação a outras categorias profissionais, porque podem apontar, por onde passam, aquilo que conceberam ou ajudaram a tirar do chão. Têm um legado visível, tangível e às vezes notório do qual se orgulhar. Mas se "um erro em bronze é um erro eterno", como dizia Mario Quintana, equívocos em concreto, madeira, aço e vidro são igualmente difíceis de ser desfeitos – e Brasília está aí para provar.

Acertos, felizmente, também. E a trajetória de Pedro Simch esteve repleta deles.

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Quarta, 02 Abril 2025

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