A marcha da insensatez
A varejista on-line Amazon assumiu o comando, há um mês, da cadeia de supermercados norte-americana Whole Foods, conhecida tanto por seus produtos orgânicos e de procedência certificada quanto pela fama de careira. Segundo analistas, a tendência é que a gigante do comércio eletrônico promova agressivas reduções de preços nos produtos da Whole Foods, replicando, assim, a estratégia aplicada em seu próprio negócio, quando suportou prejuízos homéricos para firmar-se no setor de livros e, mais recentemente, no de gêneros alimentícios e de manutenção do lar (saiba mais aqui). Se os rivais da Whole Foods repetirem o que Barnes & Noble e WalMart fizeram quando atiçados pela Amazon, avizinha-se, no varejo supermercadista americano, uma disputa ferrenha em promoções e descontos – o que nos oferece um ótimo pretexto para falar de guerra de preços.
De maneira simples, uma guerra de preços ocorre quando um dos competidores em um dado mercado reduz seus preços e recebe como resposta, de um ou mais concorrentes, medida semelhante. Da réplica vem a tréplica, que pode envolver o mesmo produto/serviço ou outro do portfólio da empresa, realimentando a disputa. Guerras de preço costumam ser mais comuns quando há um novo entrante em um mercado, que precisa chamar a atenção do consumidor, ou um player que, poderoso economicamente, pretende fragilizar seus concorrentes através da erosão do caixa. Ou ainda quando os players desejam capturar a preferência do consumidor de maneira duradoura, para serviços ou produtos que contam com barreiras de saída elevadas, como multas ou custos irrecuperáveis.
A literatura a respeito do assunto sugere, de maneira geral, que guerras de preços não são positivas e tendem a trazer prejuízos para as empresas envolvidas. Além da perda financeira, a briga costuma comprometer a imagem de marcas e produtos (devido à associação intuitiva entre preço e qualidade) e a mudar o patamar de competição do mercado (de qualidade para preço, por exemplo). Sobre esse último aspecto, em especial, convém registrar que, embora a utilização de promoções e outros estímulos ligados a preço possa conduzir a volume de vendas e market share satisfatórios no curto prazo, pode encobrir, também, vínculos frágeis entre marca e consumidor, ocultando uma “falsa fidelidade”. A quantidade de maus resultados acarretados pelas guerras de preço explica a expressão do título deste post, utilizada por um antigo professor meu para defini-las.
Por isso, especialistas recomendam responder a uma estratégia de preços agressiva com outras ferramentas – que podem até envolver preços, desde que não necessariamente reduzi-los. Formar pacotes de produtos e descontos escalonados, por exemplo, são duas delas. Introduzir marcas de combate (saiba mais aqui), fazer parcerias com fornecedores ou simplesmente posicionar-se por qualidade seriam outras possibilidades. Estudiosos também sugerem “alertar os consumidores para o risco de queda na qualidade” e lembrá-los que, no longo prazo, preços baixos podem converter-se em preços altos, devido ao risco de um “monopólio” pós-guerra de preços, por parte do vencedor (“How to fight a price war”, de Rao, Bergen & Davis, HBR, 2000).
A Amazon desfruta de uma posição ímpar: uma empresa de capital aberto que se vale dos recursos captados na Bolsa para financiar por longos períodos negócios deficitários, apenas com base na promessa de torná-los rentáveis em algum momento. Levou 20 anos para que o site tivesse lucro; nesse período, concorrentes tradicionais foram à lona devido à política agressiva de preços da empresa de Jeff Bezos – e à competência de seu sistema logístico, faça-se justiça. Tal resultado, no entanto, é de discutível utilidade do ponto de vista da concorrência econômica, uma vez que mercados importantes podem passar a ser dominados por um único player, aumentando a concentração de riqueza e diminuindo a quantidade de opções do consumidor.
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