Touro sem mãe II
Semana passada comentei o caso da Toro, picape da Fiat que ganhou vida própria e tornou-se mais forte que a marca italiana no mercado brasileiro (recorde aqui). Comentei as possíveis razões para a ocorrência desse fenômeno e lancei a questão: o que a fabricante pode fazer a partir dessa realidade?
Marcas funcionam por um processo que podemos apelidar de “contaminação”. Elas ganham atributos, positivos ou negativos, através da proximidade com outras marcas, associação a personalidades ou a determinados ambientes e lugares. Quando uma marca põe sua logo em um evento para jovens, ganha pontos em quesitos associados à juventude. Quando estampa a camiseta de um bando de brigões, torna-se momentaneamente mais frágil e antipática ao público (relembre um episódio deste tipo clicando aqui ou neste link).
Geralmente, as arquiteturas de marca mistas, como as das montadoras, têm como objetivo permitir que novos produtos sejam endossados por uma marca forte e tradicional, como a da fabricante. Qualquer novo alimento com o logo da Nestlé estampado, independentemente de como for batizado, já nascerá mais simpático ao consumidor do que se contar apenas com seu nome próprio. O mesmo vale para um veículo da VW, Fiat ou Chevrolet. É um processo em que a reputação vem de cima para baixo, da marca-mãe para a marca do produto.
Porém, eventualmente o processo pode se dar na direção contrária, do produto emprestar seu prestígio para a fabricante. O iPod foi um sucesso que catapultou a Apple não apenas devido ao seu volume de vendas, mas principalmente por posicioná-la como uma companhia capaz de desenvolver gadgets bonitos e funcionais em um tempo no qual eles costumavam ser complicados e feios. Pavimentou o terreno para que o iPhone se tornasse o maior sucesso da indústria tech uma década depois, quando a confiança na capacidade da Apple fabricar bons produtos já estava restabelecida. A Hyundai vivenciou situação parecida nos mercados brasileiro e americano de automóveis nas últimas décadas: um ou dois sucessos fortaleceram a marca e permitiram que ganhasse a confiança dos consumidores.
Algo semelhante pode ser tentado pela Fiat a partir da Toro (foto). A picape pode funcionar como cartão de visitas para a empresa tentar outras iniciativas de veículos grandes e utilitários – picapes maiores, quem sabe, ou um SUV. Estes podem até manter o mesmo nome, numa extensão de linha ou de marca, para mais adiante funcionarem como plataforma para modelos diferentes. Sucesso garantido não existe, claro; a Duster SUV, da Renault, é um sucesso, mas a Oroch, sua versão picape, não. Ainda assim, a Toro pode constituir um ativo importante na tentativa de desenvolver a marca Fiat em outros segmentos que não o de carros compactos.
Mas, para isso, em algum momento a Fiat terá de ser mais incisiva na reivindicação de sua maternidade sobre a Toro – o que, pensando bem, nem deve ser tão difícil assim. Basta para isso fazer jus a origem italiana e se comportar como uma típica mamma orgulhosa dos feitos de seu mais novo rebento.
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