O dólar vai continuar em alta?

Mercado vê possível piora e cotação acima do Boletim Focus
Mercado financeiro reajusta cotação do dólar até dezembro após alta provocada por desconfiança sobre meta fiscal

O dólar chegou ao patamar de R$ 5,65 no pregão do Ibovespa nesta segunda-feira (1), maior cotação desde janeiro de 2022. Na previsão de especialistas, a tendência para o câmbio é de piora, enquanto a moeda norte-americana deve encerrar o ano acima da previsão do Boletim Focus de R$ 5,20. Especialistas explicam que o cenário internacional de corte de juros nos Estados Unidos pode não se materializar. Enquanto isso, no Brasil, discussões sobre o alcance da meta fiscal de déficit zero em 2024 e 2025 devem continuar a pressionar o real. Eles apontam que o dólar começou sua escalada rumo à cotação de R$ 5,65 a partir de abril. A principal justificativa é a suspeita por parte do mercado de que o arcabouço fiscal não seria alcançado sem medidas de cortes de despesas primárias do governo federal. Mas, fora de casa, o dólar vem se valorizando contra as demais moedas no mundo em 2024, principalmente as de emergentes. No semestre, a divisa estadunidense subiu 8,3% contra o peso mexicano, por exemplo, moeda favorita na comparação com o real. O motivo da forte alta do dólar em escala global é, segundo Claudia Moreno, economista do C6 Bank, a mudança de projeções de juros nos Estados Unidos.

"Existia uma expectativa de que o Banco Central dos Estados Unidos, o Federal Reserve, pudesse cortar juros no primeiro trimestre", diz Claudia. "Mas vieram dados mais fortes de atividade, como emprego e PIB. Assim, juros altos na economia americana por mais tempo atraem o dólar, sobrando menos da moeda por aqui", completa. Desde o começo do ano, o Fed manteve postura firme e não cortou juros. Por outro lado, o Banco Central brasileiro iniciou um ciclo de baixa na Selic, taxa básica de juros, desde agosto do ano passado. O diferencial de juros caiu de oito para cinco pontos percentuais. Com uma diferença menor, investidores pedem um prêmio de risco maior para investirem em títulos da renda fixa no Brasil ao invés de aportarem nos Fed funds, títulos do governo americano. A queda da diferença dos juros entre Brasil e Estados Unidos inibe rendimento do chamado "carry trade" dos estrangeiros no Brasil, diz Fábio Zaclis, gestor da Daycoval Asset. "Quanto mais baixo o diferencial da Selic e dos Fed funds, ajustado pela volatilidade, o real se torna menos atrativo."

No Boletim Focus desta semana, o mercado já piorou sua expectativa do dólar diante da alta recente da moeda. Se antes a pesquisa oficial com centenas de economistas feita pelo BC apontava cotação terminal de R$ 5,13, hoje o dado é de R$ 5,20. No C6 Bank, o valor terminal do dólar é superior: de R$ 5,30 até dezembro. Mas Claudia afirma que a fintech está reajustando a projeção para cima devido aos ruídos sobre a meta fiscal do governo. "O cenário deve ser de (dólar) um pouco mais acima de R$ 5,30", afirma a economista. Ao elencar riscos que favorecem um dólar mais forte contra o real, ela cita a possibilidade de o Fed não cortar juros, mesmo com o mercado esperando um corte em setembro. "Achamos que o esfriamento da economia americana vai demorar um pouco mais. Além disso, a troca de comando do BC traz risco para o mercado, não sabemos quem vai estar lá no ano que vem."

Fabrizio Velloni, economista-chefe da Frente Corretora, afirma que "o dólar pode facilmente ir a R$ 5,80" se o governo não anunciar cortes de despesas. E, se recuar, a divisa deve estacionar a R$ 5,40. Carlos Paiva, estrategista-chefe da Constância Investimentos, associa a revisão da meta de superávit primário para 2025 à desconfiança do mercado com o fiscal. "Algumas iniciativas têm sido tomadas pelo governo para indicar um compromisso em cobrir parte do rombo das contas públicas, mas majoritariamente tratam de aumentar arrecadação (e não cortar gastos) e, com isso, têm tido dificuldade passar no Congresso", pontua Paiva. Para ele, uma queda do dólar rumo à cotação do Focus "depende muito do sucesso do governo nessas iniciativas de melhora das contas fiscais".

Dólar a R$ 6: quais as chances?
De um lado, a interrupção de queda dos juros pelo BC favorece uma alta no câmbio. Por outro, a falta de medidas para limitar despesas e interferências do governo em empresas podem levar a uma nova alta da moeda americana. "O nível atual mostra um real bastante desvalorizado e menor espaço para altas adicionais do dólar", comenta Paiva. "Por conta de alguns fatores como, por exemplo, a interrupção do ciclo de queda de juros pelo BC e a valorização das reservas cambiais, atenuando o problema fiscal, especialmente na relação entre dívida líquida do governo e o PIB", conclui. O economista diz ser "improvável" o dólar chegar a R$ 6 até dezembro. Mas Velloni e Claudia Moreno divergem.

"Dólar chegar a R$ 6 tem baixas chances, mas não dá para descartar", diz a economista do C6 Bank. Ela comenta que, no curto prazo, não há gatilhos claros para um ciclo de baixa na moeda. "A questão fiscal não tem solução fácil", comenta. Essa também é a base para Velloni considerar a cotação de R$ 6 para o dólar possível. "Trabalho com um piso de R$ 5,40 e um teto de R$ 5,80", afirma o economista-chefe da Frente Corretora. "No pior dos casos, o dólar pode ficar um pouco mais alto com um repique inflacionário. É uma possibilidade ir a R$ 6."

Com Redação da B3

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